SXSW 2018: empreendedor quer fazer você viver até os 102 anos
Categoria: Novas Tecnologias
A expectativa de vida dos brasileiros é de pouco menos de 76 anos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esse número cresceu substancialmente nas últimas décadas: em 1940, um brasileiro vivia, em média, só 45 anos. Esse aumento, que também ocorreu em nações ricas e outros países em desenvolvimento, ocorreu graças aos avanços da medicina, à implementação de sistemas de saneamento básico e às medidas de saúde pública.
Agora, empreendedores trabalham para que a longevidade dos seres humanos vá além. Um deles é o biólogo americano Ned David. Ele está à frente da Unity Biotechnology, empresa que aposta em uma “limpeza” das células para retardar o envelhecimento. David participou de um painel sobre mobilidade no South by Southwest (SXSW) nesta segunda-feira (12/3).
A empresa já recebeu US$ 151 milhões em financiamentos desde sua criação. Peter Thiel, conhecido por ser o fundador do PayPal, é entusiasta da busca por uma vida mais longa e um dos apoiadores da empresa.
As células humanas passam por um processo natural de envelhecimento, causado por dois fatores principais: um limite de divisão celular que impede a troca de tecidos velhos por novos e a liberação de uma enzima, chamada beta-galactosidase, que se acumula com o tempo e impede que a célula realize suas funções normalmente. “Conforme a enzima vai se acumulando, mais e mais células são contaminadas, de forma parecida a um ataque zumbi”, afirma o empreendedor.
O trabalho da Unity está em retirar essa enzima das células. A empresa foi criada há seis anos e vem desde então fazendo testes em ratos e desenvolvendo substâncias capazes de fazer essa “retirada de impurezas” das células.
A empresa costuma realizar testes com um ratos irmãos nascidos na mesma ninhada. Um deles recebe medicação contra a beta-galactosidase, enquanto o outro não toma nada. Os resultados dos estudos mostram que a “limpeza” de fato retardou o envelhecimento dos animais que tomaram o medicamento. Enquanto isso, os ratinhos que não foram tratados aparentavam estar muito mais velhos e desenvolviam uma série de doenças renais, cardíacas e ósseas, bem como tumores malignos.
Em média, os animais medicados sobrevivem 35% mais que os irmãos. De acordo com David, a expectativa da empresa é que resultados semelhantes sejam vistos quando forem realizados testes com seres humanos. Ou seja, o remédio poderia elevar a expectativa de vida dos brasileiros para 102 anos.
Testes com humanos, de acordo com o empresário, devem começar ainda neste ano. Segundo David, os primeiros medicamentos lançados pela Unity fariam o tratamento específico para algumas doenças. “Criaríamos remédios com a tecnologia capazes de tratar artroses, doenças oculares e pulmonares”, diz. Em outro momento, a meta seria lançar remédios que atuassem em todo o corpo, tratando células com a enzima conforme surgissem.
E se?
David foi a estrela de um painel que também contou com a presença de Laura Deming, cofundadora do The Longevity Fund, um fundo de investimento focado no apoio a startups que atuem em soluções para o aumento da expectativa de vida dos seres humanos. A jornalista Eillie Anzilotti, da Fast Company, mediou a conversa.
Durante a conversa, os três também falaram sobre como o aumento da longevidade humana mudaria a sociedade em que vivemos.
De acordo com Laura, os tratamentos de longevidade fariam com que uma questão ética surgisse: e se alguém desejasse não tomar os remédios e deliberadamente morrer mais cedo do que poderia? “Decisões como essa poderiam gerar polêmica. De qualquer forma, eu defendo que, apesar de defender a extensão da vida, cada um deve ter o direito de fazer o que quiser com ela.”
Já David falou sobre prováveis mudanças na previdência social. “Com as pessoas vivendo mais tempo, seria natural que o poder público alterasse as regras da aposentadoria, aumentando o tempo de contribuição dos trabalhadores”, diz.
Quando perguntado pela reportagem sobre a possibilidade de somente pessoas ricas poderem usá-los e de um possível aumento da desigualdade entre países ricos e pobres, David afirmou que não acredita nesse cenário. “Em países ricos ou pobres, o gasto com um medicamento como o nosso evitaria gastos enormes em tratamentos de saúde convencionais. Além disso, ter mais pessoas contribuindo para o funcionamento do Estado também deverá ser visto como algo bom pelos governantes de todo mundo”, afirma.
Também segundo o empreendedor, o aumento da longevidade daria incentivo a quem quisesse, por exemplo, mudar totalmente de rumo após algumas décadas de vida. “Uma vida maior daria a chance para as pessoas seguissem carreiras completamente diferentes, fizessem outras faculdades e se dedicassem a outras paixões.”
Época Negócios, (12/03/2018)